- Natalie Portman -
- 08 -
SÍLVIDES
Em outro dia qualquer chegou ao
consultório do doutor Nardelli a cliente Gilda Nolasco para retornar aos seus
exames de rotina. A moça de dezoito anos vinha fazendo esses exames há certo
tempo, pois queria não ter mais as crises neuróticas sempre a lhe atormentar no
vagar dos tempos. Tais motivos Gilda não sabia dizer muito às claras. Apenas
ela não tinha certeza de tudo o que faria. E o doutor prosseguiu na sua
conversa monótona após os cumprimentos habituais.
Nardelli:
--- Algo de novo? – perguntou.
Gilda se compôs em sua cadeira
almofadada e olhou para o médico com a cabeça um pouco abaixada e nada falou
por alguns minutos. Em seguida ela recitou uma frase qualquer.
Gilda:
--- Eu fui ao cinema. Um filme
com Greta Garbo. Ouvi dizer ser ela uma lésbica! Verdade? – indagou sem
conhecer.
Nardelli:
--- Não sei. Não me ligo muito ao
tema. Cinema. – respondeu.
Gilda:
--- Ela é um tipo de rara beleza.
Como o senhor não conhece? Talvez conheça Fifi D’Orsay! Não? – indagou.
Nardelli:
--- Não a conheço também. Mas.
...Prossiga! – recomendou o psiquiatra.
Gilda:
--- Nem adianta. O senhor não
conhece as divas! Nem Louise Brooks, Alla Nazimova? Também não. Nem precisa
falar. Pois eu adoro Greta Garbo. Sedução em pessoa! Eu queria tanto olhar para
a diva! Apenas ver de longe! No Brasil tem lésbicas? – indagou querendo saber.
Nardelli:
--- Isso deve ter. Mas não sei te
responder. – disse o psiquiatra.
Gilda olhou ao seu redor e viu um
divã acolchoado, repleto de travesseiros com uma coberta de veludo e em uma
parte mais alta onde podia se deitar acomodada. As cores estonteantes
demostravam um prazer de sensualidade e orgasmo deleitoso. Gilda então indagou:
Gilda:
--- Eu posso usar desse divã? –
quis saber.
Nardelli:
--- Com certeza! Pode sim. – declarou
o psiquiatra.
E Gilda se levantou da poltrona e
caminho até o divã onde no meio do caminho olhou para Nardelli, sorriu e seguiu
como quem diz ser para apenas experimentar um pouco. A brisa vinda do mar
chegava até a sala do psiquiatra com o gorjear dos pássaros, o palmilhar das
doninhas e o cantar de alguém de fora, distante até. O médico fechou a janela e
abaixou a cortina pondo a lâmpada acessa em direção à moça. E Gilda se deitou procurando o lugar bem mais
confortável para alongar e encolher o seu corpo. O médico se aproximou e puxou
uma cadeira onde foi possível se sentar sem mais incomodar à cliente. Gilda
sorriu quando esticou o seu corpo esguio. E falou sem pressa:
Gilda:
--- Eu gosto de dançar ou ver
alguém dançando. Para mim é total beleza. O sapateado. O artista faz com os pés
aquela dança. Como a dança Lago dos Cisnes. A beleza estonteante da bailarina.
Ela se segurando em apenas um pé. Jovem e bela. Um delírio. E a música de
Tchaikovsky! É tudo muito belo. Uma alucinação! – enfatizou a moça com senso
embriagador
O psiquiatra ouvia a linda jovem
em profundo silêncio a procura de deixa fluir aquele êxtase supremo. A virgem
calou fundo no seu delírio alucinante. O
psiquiatra, a sua frente, sentado em uma poltrona com uma caderneta a mão apenas
ouvia a moça falar cativante com seu jeito terno e enlouquecedor. Por certo
tempo e bem depressa Nardelli verificou as horas no relógio de pêndulo alteado
na parede a sua frente. Por seu turno, Gilda, sem se importar, fechou os olhos
como se estivesse em um profundo sono. Era um desvario de total afeto pelas
danças em ondas em torno das lindas pequenas sílfides no eterno azul do
cativante palco da vida. Por fim, a moça adormeceu como por encanto. A brisa
suave da mata lhe entorpecia os seus enigmáticos sentidos. E com isso, a
deidade viajou em um eterno e demorado trenó igual ao chamado pelo de papai Noel. Gilda viajou por infindas montanhas de neve
conduzidas por seus obedientes veados para se acercar ao baile sublime das
sílfides. Fadas ou anjos, seres de alta sensibilidade viventes nos eternos
lares das colinas. Cristais de gelo eram modelados pelas divinas sílfides,
formando em flocos de neve a reunis as nuvens.
Gilda:
--- O que fazes? – indagou a
sílfides.
Sílfide:
--- Flocos de neves. – respondeu-lhe
com imenso deleite.
Gilda:
--- Flocos? Para que? – indagou
perplexa.
Sílfide:
--- Para a dança dos alegres
espíritos. – enfatizou com estilo.
Gilda:
--- Espíritos? E espíritos
dançam? – perguntou atordoada.
Sílfide:
--- Sim. Para o sono dos poetas e
artistas. – declarou sorrindo.
Gilda:
--- Que artistas? – indagou ainda
mais perplexa.
Sílfide:
--- Os artistas da beleza. –
destacou sorrindo.
Gilda:
--- Eu nunca ouvi os artistas
falarem em você, ó sílfide. – relatou com estranheza.
Sílfide:
--- Tu nunca ouviste falar nas
fadas do ar? – indagou quase assustada.
Gilda:
--- Não. Nunca! E elas existem? –
indagou assustada.
Sílfide:
--- Ah. Existem desde o princípio
dos tempos. – responde de forma sossegada.
Gilda:
--- Desde o princípio dos tempos?
– indagou alarmada.
Sílfide:
--- Ah. Desde o canto da
primavera. – relatou a sorrir.
Gilda:
--- Primavera? – indagou
angustiada.
Sílfide:
--- Sim. Quando sopra a suave
brisa das ilhas somos nós as sílfides. – disse sorrido
Gilda despertou de súbito e então
olhou para o doutor Nardelli como se o médico fosse um pleno fantasma e não a
conhecesse por longo tempo. O relógio de parede bateu as seis horas da tarde.
Tudo era o fim.