domingo, 14 de setembro de 2014

O INFERNO - 13

Gene Tierney
13
ENTERRO
Na segunda-feira, pela manhã, Sócrates estava em seu trabalho, em um edifício de um andar mais o térreo, na Rua Dr. Barata quando observou de cima o estranho trajeto de um lutuoso sepultamento. O carro fúnebre seguia à frente em seu silencio sepulcral e logo após outros veículos, cada um com grinaldas para depositar junto ao morto. Isso não era tão comum naquela estreita rua onde cabiam dois carros e nada mais. Mesmo assim, Sócrates deu importância ao fausto sepultamento a transitar por aquela artéria pouco lembrada por moradores de outros bairros. Com razão o rapaz observou com bastante atenção a passagem do féretro seguido de veículos dada a importância do morto. A morte do falecido tinha sido anunciada nos jornais e a emissora de rádio da cidade. O féretro era do doutor Claudio Alcântara de Melo, homem de tradição social na cidade no Natal tendo ocupado a Presidência do Tribunal de Justiça por um longo período. Cidadão querido por toda a gente influente da província e mesmo do Estado o doutor Claudio Melo, já desembargador estava aposentado, porém todos os convivas teciam saudades por sua gestão à frente do Tribunal de Justiça por longos tempos. Homem austero e de pouca conversa, salvo com amigos mais chegados. Ele havia nascido naquela rua há longo tempo e sempre desejou quando viesse a ser sepultado ser o cortejo passar por aquela rua.  Na cúpula da Igreja do Senhor do Bom Jesus os acordes comoventes e melancólicos dos sinos repicavam a um som em compasso angustioso e lento estimando à lembrança do importante morto. Era então a hora da despedida para o magistral homem das letras. Pelo sabido de fontes acadêmicas o Doutor Claudio Alcântara de Melo tinha escrito diversos volumes, principalmente sobre a tardia seca do Estado onde ele nascera. O caso, para Sócrates, teve grande importância pelo morto ser padrinho do seu patrão Augusto Novais. E não por acaso ter Sócrates acompanhado com o seu olhar todo o féretro. As lojas de comercio fecharam suas portas como justa homenagem ao ilustre fidalgo desaparecido. O rapaz teve oportunidade de ver o auto do seu patrão a conduzir soberbo acoplado a sua esposa e as duas filhas do casal. Era o tempo de contrito rezar.
Com o passar das horas Sócrates se voltou ao seu afazer. Ele estava a cuidar dos livros do escritório e receber a moça dos seus 18 anos que chegava pela primeira vez para o seu novo emprego. Com certeza a virgem não sabia de nada e estava apenas à espera do que o rapaz dissesse o que teria de fazer, como espanar os moveis ou outra coisa qualquer. Mesmo assim não foi decerto que Sócrates se posicionou. E indagou com calma:
Sócrates:
--- Teu nome? – indagou.
Moça:
--- Norma. Norma Balistiero. É italiano. Meu pai. – decifrou a moça.
Sócrates:
--- Hum! Belo nome. Balistiero. Você já trabalhou em alguma loja ou escritório? – quis saber.
Norma:
--- Eu, nunca! Esse é o meu primeiro trabalho. Eu cuido sempre da minha casa. – fez ver.
Sócrates:
--- A senhorita saber bater máquina? – indagou com paciência.
Norma:
--- Eu fiz o curso. Sete meses. Aqui está o diploma. – lhe entregou o certificado de conclusão
Sócrates passou vistas no certificado e em seguida lhe disse:
Sócrates:
--- Bem. Já é um bom proveito. A senhorita fica naquela mesa onde está a máquina e aonde tem uns papeis para datilografar. Deixe-me os seus documentos para o registro formal. O chefe da repartição, como a senhorita deve saber, é o doutor Augusto Novais. Ele está um pouco tardio pois foi a um sepultamento. Certo? – dialogou.
Norma:
--- (Eu) compreendo. Com licença. – e se voltou para a mesa de datilografia.
Ao se postar na máquina de datilografia, Norma Balistiero notou a existência de um livro, por sinal de teor espírita, e não quis mais folhear o volume por ser do chefe ou do seu auxiliar, com certeza. No entanto Norma foi por demais astuta e embora com o volume fechado, notou algo que depressa o identificou. Muito embora soletrando o seu datilografar, observou no compêndio algo bem mais salutar. O livro tinha em seu início a palavra “Arcano”. Um profundo segredo; um mistério.  Algo de surpresa lhe sacolejou o cérebro. Muito embora o livro estivesse fechado, de modo sutil Norma indagou ao seu superior que estava no seu local de trabalho o tal enigmático e por demais desconhecido tomo.
Norma:
--- Com licença. Esse livro é do senhor? – indagou cismada.
O rapaz, com surpresa, declarou:
Sócrates:
--- Ô! É. Pode deixa-lo guardado na gaveta! – disse o homem como por descuido.
O livro focava o conhecimento misterioso às pessoas comuns. Uma essência secreta ou remédio: um elixir. E destacava o livro: “No coração de toda grande tradição mística e religiosa persiste um segredo, uma verdade universal: O Grande Arcano”. Ao longo da história foi expressamente proibido revelar os segredos do Grande Arcano ao público. Assim seus mistérios permaneceram um legado oculto velados por histórias místicas e pela herança mundial da arte e literatura para todos admirarem. Alguns imitarem, mas poucos entenderem. Escondida nas faces silenciosas dos monumentos egípcios sob o olhar dos deuses védicos entre as linhas dos antigos livros de alquimia e nos atormentando pelos mitos astecas e maias a essência da Doutrina Secreta sempre esteve presente. Durante toda a história da humanidade somente os poucos eleitos foram iniciados nos mistérios desta Grande Verdade Universal e estes poucos guiaram o resto da humanidade e deram a ela os símbolos externos desta Verdade como orientação.  Pois o Grande Arcano, o segredo dos segredos, era ferozmente protegido e oferecido apenas aos que tinham provado sua pureza moral e confiabilidade. Mas como a humanidade se degenerou em barbarismo e crueldade, o conhecimento divino foi ocultado para sobreviver em bolsos isolados ao redor do mundo. Por muitos séculos o Grande Arcano tem acenado à humanidade por detrás de histórias e mitos que o velavam. O conhecimento que ele entrega é universal e se aplica a todas as verdadeiras religiões e tradições místicas. Quer seja a serpente de Adão e Eva da tradição judaico-cristã, a serpente alada de Quetzalcoatl da tradição asteca, as serpentes escalando o caduceu do deus grego Hermes ou as serpentes das tradições hindu ou budista, todos estes símbolos contêm o mesmo ensinamento. Enfim, depois de séculos de escuridão e ignorância, chegou a hora desta doutrina secreta ser revelada.
SEXO
Todas as religiões são joias preciosas no cordão de ouro da divindade. A palavra “Religião” deriva-se da raiz latina “religare”, que significa “União”. A palavra “yoga” é derivada da raiz sânscrita “yug”, que também significa “união”. Em sua base, as diferentes tradições do oriente e ocidente descrevem a mesma meta: “União com a Divindade”. As tradições religiosas provêm o mapa que deve ser seguido para se alcançar a unificação com o Divino. Toda religião busca expressar o mesmo núcleo de conhecimento. Mas são necessárias as ferramentas certas para ler o mapa. Com as ferramentas certas e o uso adequado delas um aspirante de qualquer religião ou tradição pode entrar no conhecimento da experiência direta com o Divino. Pode ser visto, então, que existe na verdade uma única ciência, um único caminho, mas aparecendo com diferentes nomes e faces. “Porque estreita é a porta e apertado o caminho que conduz à vida, e são poucos os que a encontram”. Em suma: “a porta é a abertura da entrada para aonde o órgão sexual masculino penetra para despejar o sêmen lá dentro e conceber o seu filho ou filha”. Em grego, o caminho estreito é chamado “Gnosis” que significa “conhecimento”. Em hebraico, o mesmo caminho estreito é chamado “Daath” que também significa “conhecimento”. Este caminho é representado pela famosa Árvore do Conhecimento - “a mulher” - no livro de Gênesis. E a pista para se entrar na experiência direta de Deus “na bíblia hebraica se registra “Deuses” pode ser encontrada através do entendimento do símbolo da Árvore do Conhecimento – o conhecimento do homem com a mulher. – o ato sexual - O Gênesis, o ensinamento judaico-cristão da criação foi escrito como um meio para se transmitir o conhecimento do Grande Arcano para aqueles que tivessem “olhos para ver e ouvidos para ouvir”. Sua origem foi influenciada por ambas as tradições oriental e ocidental a fim de prover a humanidade uma chave contida na fundação de todas as grandes religiões do mundo.
- oOo -
Eram 11 horas da manhã. Por conseguinte, a hora do almoço dos funcionários. No escritório, Norma Balistiero nada falava. O chefe geral ou patrão dos funcionários, Augusto Novais, tinha chegado bem tarde e, possivelmente ainda tinha muito o que fazer. O sepultamento do seu padrinho, Claudio Alcântara de Melo atrasou bastante, com os profundos sentimentos de pesar expressados por cada qual e isso retardou densamente o féretro. Além disso houve discursos de velhos amigos, a fala do Governador do Estado, oração ao pé do tumulo pelo vigário e mais e mais. A moça esperava o sinal de saída para poder ir de vez e voltar a uma hora da tarde. Na certa alguém falaria com Norma, certamente. 

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