quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

SUSPEITA - 11 -

- Ana Araujo -

- 11 -

CASOS

Naquela mesma noite, por volta das seis horas, estava em casa o doutor Nicácio Lopes fazendo a vez de companhia a dona Mariquinha, mulher de seus 75 anos de idade, benzedeira por excelência que naquele instante procedia a cura na filha Alva do casal. Por conseguinte, Alva era a filhar menor de doutor Nicácio e dona Clara. A menina tinha sentido um quadro febril, talvez por uma gripe que a anciã chamava “resfriado”. Entre curas e conversas, dona Mariquinha ouviu do homem a história do desaparecimento do cadáver do hospital, caso rumoroso, falado apenas entre funcionários, médicos e assistentes. Nicácio tomou conhecimento, por acaso, quando conversava com o doutor Paiva. Por ter sido a residência do senhor Otto Câmara o local onde caiu o defunto vindo não se sabe de onde, Paiva perguntara a Nicácio se havia algo de novo no caso. E daí em diante Nicácio ficou sabendo que o cadáver havia sumido por acaso:
Nicácio:
--- Incrível! Como pode ter sido uma coisa dessas? – argumentou surpreso
Mariquinha:
--- O Diabo vem buscar os seus! – comentou em voz branda.
Nicácio
--- Diabo? Que diabo? – perguntou surpreso
Mariquinha:
--- O Povo das Sombras. Eles vêm e pegam o defunto e, depois, somem. - declarou
Nicácio;
--- Isso é história de “Trancoso”. Tá vendo que não acredito nisso? – reagiu
Mariquinha:
--- Pois o vulto negro existe. E se existe? Ah, como existe! – fez finca-pé.
Nicácio:
--- A senhora tem alguma prova dessa existência? – perguntou duvidando.
Mariquinha:
--- Se tenho? Ora se tenho! Tenho muitas! – declarou com voz tímida.
Nicácio
--- Eu quero ouvir! Estou pronto! – confirmou
Mariquinha
--- Senhor! Eu sei que o senhor é pessoa e alto conhecer. Eu sou uma pobre viúva. Eu conto aquilo que eu vejo. E em poucas palavras. – relatou a anciã
Clara
--- Pois contou o que a senhora viu, certamente. – e olhou para o esposo então quieto.
Mariquinha:
--- São muitos casos. Não sei por onde começar. Visões! E até bruxarias! Eu vejo! Apesar de não ser devota dessas bruxarias, e nem quero ser, pois Jesus é o maior de todos os homens que viveram aqui na Terra, eu tenho esse poder de atravessar barreiras e ver o que o povo não quer enxergar. Todos nós temos esse dom. Aquele homem que se encontrou com Jesus, ele não era o diabo, apesar de ter sido chamado assim. Ele era um homem rico, dono me muitas cabras e coisa e tal. Mas voltemos ao que interessa. Certa vez, eu estava rezando um terço à Nossa Senhora quando eu vi passar pelo quarto onde tenho o meu santuário um vulto escuro. Eu diria até que era um homem das Sombras. Ele parou na porta do meu cubículo e indagou: - relatou
oOo
Vulto:
--- O que está fazendo aí, velha macumbeira? – falou com um tom de voz agressivo
Mariquinha:
--- Eu olhei para o vulto e respondi que era velha mas não macumbeira. E ele deu uma colossal risada. E eu respondi: “Quer rezar no meu rosário?” – indaguei.  E ele se revolto
Vulto:
--- Rezar? A senhora está pensando que eu sou carola? Rezar nessa bodega? – e cuspiu.
Mariquinha:
--- Pode ser bodega. Mas é a Imagem de Jesus que está nessa bodega. – falou a anciã com altivez
Vulto:
--- Ora! Vá se catar que eu tenho mais o que fazer! – falou em tom de deboche
Mariquinha:
--- Tenha respeito por Deus, nosso Criador, sua besta ferra! – agrediu com palavras
O Vulto gargalhou por ver a anciã alterada. Em seguida o Vulto confuso com a cara feia e rude, desdenhou à anciã
Vulto:
--- Seu Deus não vale nada! – preferiu zombando
Mariquinha:
--- Tome tento seu bruxo. Tome tento! ... O meu Deus é maior do que o seu inferno! – atacou
Vulto:
--- Prove! Prove! Eu mostro quem é Satanás! Prove! – falou brabo o Vulto
Mariquinha:
--- Eu não precioso provar! Ele é único! Vocês são aos montes! – falou ríspida
Nesse momento, como uma fagulha, desceu do Céu a chama do terror apagando tudo o que o Vulto havia dito. A anciã estava com o seu crucifixo na mão de frente para o Diabo e sacudiu um punhado de água benta que estava em um frasco de vidro. E a mulher ainda proferiu.
Mariquinha:
--- Larga de mim Satanás! Larga de mim! Deus é justo e verdadeiro! – falou embrutecida.
E o Diabo saiu esfogueado tonto pelas chamas do Céu penetrando de mato adentro. E foi o último e misterioso acendo que o Demônio teve com a anciã. Depois daquele dia, nunca mais o misterioso ser voltou a incomodar a dona Mariquinha. 
E dona Mariquinha ainda falou para o doutor Nicácio Lopes, com a sua voz já um tanto cansada, apoiada em sua bengala e de saia bem comprida arrastando no chão.
Mariquinha:
--- E tenho outras histórias. Quer ouvir? – indagou a anciã.
Nicácio:
--- Não. Não. Besta essa! – falou sem sorrir.
Mariquinha:
--- Tem muitos mistérios nesse mundo. Muitos. Uma imensidão. Eu vi, outro dia, uma visagem. Eu digo visagem porque era uma visagem mesmo. Ela estava perto de um cajueiro. Eu fui até perto, então ela sumiu. Puft. Sumiu. Eu morava no sítio e era de madrugada. Eu me levantei da minha rede e fui catar lenha. Mas a visagem tornou a aparecer. Era uma mulher bem alta, cabelos negros, pele clara. Eu não me assombre porque visagem é comum de se enxergar. Então eu perguntei a bela mulher.
oOo
Mariquinha:
--- Quem estás a procura?
Visagem;
--- Meu marido. – respondeu
Mariquinha:
--- Vocês moram aonde? – indagou
Visagem
--- Nessa casa! – e apontou para a casa onde Mariquinha morava. E, de imediato, sumiu.
Mariquinha:
--- Ei. Minha senhora! Chegue aqui! Vamos conversar! – chamou a anciã

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