sexta-feira, 25 de julho de 2014

O INFERNO - 05

O CÉU
05

E o debate prosseguiu por longas horas entre Sócrates e Canindé tendo ouvinte a irmã do segundo, a infante moça Racilva. Na verdade, a infante apenas fazia ouvir a preleção do rapaz com os seus olhos bem acesos cambiando para um lado e para outro, onde a conversa interminável entre os dois prosseguia em consequência. Entre os demais temas surgiu o delicado tema do céu, esse local para onde todos têm que ir um dia após viver na Terra. Mesmo assim, o céu não tem nada de claro. Esse é um ambiente escuro, sem luz, totalmente negro. Apenas as estrelas – tal como o Sol – se pode enxergar do outro lado da Terra. O Céu é um ambiente noturno não sendo possível se enxergar algo visível a olho nu. À noite, aqui na Terra, ao se enxergar o Céu, apenas se vislumbra algo negro e sem luz alguma a não ser a luz emanada das estrelas, muitas das quais bem distantes e algumas já não existindo, chegado com muito atraso a sua luz. O Universo é infinito e as estrelas e galáxias são distribuídas por esse Universo.
Sócrates:
--- Na verdade, o Céu é uma “divindade” filho de Urano, marido de Terra que se chama Gaia. Esse conjunto se forma como os pais dos Titãs. Em geral aceita-se o “mito” de Céu como esposo de Gaia (a Terra) – falou de modo delicado.
Canindé:
--- Eu não entendo muito bem o que você me diz. Eu queria saber para onde nós vamos depois da morte? – indagou severo.
Sócrates olhou bem para Canindé antes de começar a responder. Racilva ficou atenta ao falar do visitante com uma visão penetrante querendo saber se de fato o rapaz teria meios de falar com precisa sabedoria. E foi assim o que ocorreu.
Sócrates:
--- Bem. Vejamos. Há estudos de Universidades onde mostram os bebês já nascendo sábios. Essas crianças de tenras idades já sabem antes de completarem um ano de vida. Elas sabem de tudo, inclusive dos objetos circunstantes. A Doutrina Espírita entende, desde a codificação que os espíritos já encarnam com o conhecimento adquirido nas vidas passadas. Assim como a encarnação tem um período médio, há também um período médio entre encarnações. O que ocorre logo após o desencarne é uma das grandes curiosidades dos seres humanos. Tanto que a maior parte tem medo de morrer porque não sabe o que virá. A pessoa tem receio do desconhecido. No entanto, o desencarne não é tão assustador. Ao contrário: Seria uma continuidade do aprendizado conseguido enquanto encarnado. É um aprendizado de evolução. – falou muito sério.
E continuou Sócrates o diálogo para nortear de uma forma bem melhor para onde seguem os espíritos logo após a morte do corpo, mesmo sendo de um ancião.
Sócrates:
--- Você, ao morrer, não vá pensando onde está fulana ou sicrana. Querer encontrar outras pessoas ou seres já mortos ou desencarnados: nem pensar. Quando se morre não se fica ao leu, por aí, vagando. Todos os espíritos ao morrer o corpo serão recebidos por outros espíritos, não raro seus parentes ou da mesma afinidade. Quando não, o espirito segue o igual caminho que ele deseja. Sempre haverá espíritos que tem um maior ou menor entendimento. O espírito sempre é um só, apenas do outro lado da vida. – explicou.  
Canindé:
--- É danado mesmo! Eu não vou encontrar nem um amigo de infância? – perguntou irado.
Sócrates sorriu e ao mesmo tempo desmanchou o riso. Racilva, estando ao lado de ambos, sorriu franco, pois lembrou de amigos mortos em acidente de carro. E deixou de sorrir esperando a resposta, afinal a questão também lhe interessava.
Sócrates:
--- Veja bem. Na lei – digamos: “divina” – não há privilégios. O meu ou o de algum ente, ao passar para o outro lado da vida vai se submeter apenas as suas ordens. Não raro, um espirito vem ao mundo para indagar sobre um ente – talvez querido – e esse espírito não vai ao ente que ele procura. Ele está vindo a outro ser vivente. O porquê disso não sei dizer. Mas é uma questão de acertos. Eu vi uma moça dizer ter sido perguntada por um espírito como estava o seu filho. Esse filho continuava aqui. A sua mãe já havia falecido. Então: por que a mulher não foi ao próprio filho? Enigma! Esse caso tem muitas variações! A vida no mundo espiritual é bastante movimentada. A questão é que não se fica parado na espiritualidade. – disse ainda.
Racilva participou do diálogo e quis saber mesmo se o espírito ao se desencarnar como fica a sua situação financeira. E Sócrates respondeu:
Sócrates:
--- Moça. Espírito algum tem situação financeira. Você me pergunta por dinheiro. O homem vive para si. Tem casas, lojas, edifícios, aviões, navios, trens e muito mais. Porém, ele descobre quando se passar para a vida espiritual nada disse ele levou. Entretanto, tem uma questão: a família espiritual tem riquezas como não se tem aqui. Essas riquezas são fluidas o qual se passa para todos. Mas, egoísmo, orgulho, vaidade. Isso desaparece. Agora, os que ainda estão ligados à matéria, quando passam, então se nota constrangido a procura de receber os seus ganhos, pois ele não percebeu ter se deslocado da vida terrena para a vida espiritual. – confirmou.
Canindé ficou calado por alguns momentos e com a cabeça abaixada a olhar as folhas mortas caídas ao chão vindas de uma árvore existente em um pomar de sua casa. Um caso fortuito de residências ao largo da avenida onde famílias não tão pobres habitualmente residiam entre os pingos de água de uma torneira deixada aberta por esquecimento ou coisa assim. Pássaros canoros a voltear em torno do extenso quintal repleto de cheiro de mato. Um grito estridente de uma mulher a chamar o seu filho em uma casa não tão distante ou um rapaz a oferecer os jornais da manhã chamando a atenção para um crime cruel. O bonde a passar fazia algo de qualquer coisa habitual quando o motorneiro pisava no atroz apito alertando o humilde caminhante pessoal quando vinha ou não da rua do mercado ao longe. Alguém voltar de seu lugar distante com o trompete ainda a tocar uma melodia imortal e enigmática de acordes dissonantes. Essa era a vida do amanhecer.
Canindé:
--- Céu. Céu. Afinal o que é o Céu? Bem sei que o Mundo é cadeia imortal onde todos nós viventes nunca chegaremos ao seu fim. É muito longe. É infinito. Mas, por que dizer que eu irei para o Céu? – perguntou.
Sócrates imensamente sorriu. E logo após, parou. E falou:
Sócrates:
--- A definição sintética de Céu é o estado de consciência. Haverá no Universo lugares circunscritos para as penas e gozos inerente ao grau de perfeição. Cada uma tira de si mesmo o princípio de sua felicidade. E como eles estão pôr toda a parte, nenhum lugar existe destinado a uma ou outra “pessoa”. Ou seja: “Espirito”. O inferno e o paraíso não existem. Pôr toda parte há Espíritos. – completou o rapaz de uma forma suave ao se expressar.
Canindé:
--- Entendo. Entendo. Quer dizer que agora eu estou tendo uma noção do espiritismo. – destacou
A conversa prossegui por uma infinidade de tempo com as explicações enumeradas pelo jovem Sócrates enquanto não chegara a hora do almoço.
Passaram-se dias quando Canindé saiu de sua augusta residência buscando o roteiro do Cante do Mangue onde havia a chegada dos barcos de pesca. O local era remoto. Por isso mesmo, Canindé se pôs a bordo de um Bonde saindo da Cidade e ficando na Ribeira. Dali então era uma tirada e tanto seguindo o rapaz por meio de lamaçal vez haver em todo o trecho vasto manguezal por onde muitas vezes até mesmo os moradores seguiam por outros caminhos para não ser atropelado pela lama a brotar cheia do extenso Cais do Porto onde atracavam os navios de cabotagem. Era manhã e Canindé seguia com bastante cuidado do lamaçal existente no caminho onde havia uma ponte de madeira com três ou quatro paus de coqueiros. O rio agitado por suas fortes marés enchia de limo o terreno ao lado. Nesse ponto, outro cavaleiro seguindo a pé igual a Canindé quis fazer conversa no local onde estava a ponte de madeira. Canindé se atropelou no atravessar por causa da conversa do senhor. Este sorriu a seu modo. E ainda perguntou:
Estranho:
--- Vai ao Canto? – indagou a sorrir o estranho.
Canindé:
--- E o meu desejo. - refletiu o rapaz.
Estranho:
--- Cuidado com as ostras. – advertiu o homem.
Canindé não bem sentiu nada do que o homem falava e nada respondeu. Ele simplesmente prosseguiu caminho.





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