O MAR
06
O
Sol já aquecido da manhã deixava queimar com todo ímpeto a carne musculosa dos
braços do rapaz. Em certa ocasião Canindé desviou o olhar para ver o astro e
sentiu mais forte o seu ardor de apenas às 09.00 horas da manhã. Algo tenebroso
lhe fez ofuscar a visão. Ao seu lado caminhava o homem procurando atravessar a
ponte improvisada naquela rua sem nome. Na passagem tinha o mangue onde havia
vegetais típicos da maré do rio Potengi antes de alcançar o mar com uma
sequência de peixes miúdos e crustáceos como camarão e caranguejo uçá espécie
franca da região onde surgiam quando a maré era baixa. Havia mangue de um lado
e outro da ponte de paus. Essa ponte só permitia a passagem por cima, uma vez
ter por baixo a lama da maré e de um riacho de águas fétidas vindo da região do
Jacó para um baixio chamado de Petrópolis. Com o temor de um escorrego, Canindé
atravessava a ponte com os seus braços abertos feito um aeroplano até atingir a
margem seguinte. Do mesmo modo seguia o homem. Ambos alcançaram o solo firme
quando Canindé sorriu para o seu acompanhante temendo em falar do cruzamento estremecido
aquela que ambos tinham feito. Mal se virou para falaz ao homem, Canindé sentiu
um calafrio ao perceber não haver alguém a não ser uns catadores de peixes e
caranguejos do outro lado do mangue posto em terra quase firme. Era bem
conhecida a Rua São João onde a água batia nas portas dos casebres quando a
maré estava cheia. O certo é que Canindé se estremeceu por todo e de vez
escapou a procura do local chamado Canto do Mangue onde em meio da pouca gente
ali existente procurou alguém para lhe falar de uma assombração sucedida em
plena manhã de sol.
Canindé:
---
Socorro! Socorro! Uma visagem! Socorro! – gritava estremecido o rapaz.
Quase
ninguém deu a menor importância julgando ser ele mais um louco com o costume de
aparecer naquelas paragens entre barcos e navios. Nem por isso houve quem o
fizesse clamar por ajuda diante do visto naqueles instantes logo perto do
porto. Alguém já havia surgido naquele meio clamando ajuda por ter visto uma
serpente. Outros temiam dizer ali bem próximo está uma baleia. Então o moço
estava a gritar por causa de um fantasma em plena manhã. Os barqueiros,
esgotados da exaustiva pesca de alto mar, não era de admirar alguém, o ébrio
com certeza, clamando pela incerteza de uma assombração em plena manhã. Uma
mulher a fazer tapioca com peixe frito à margem do rio teve a paciência de
rogar calma ao rapaz, pois estavam naquele curso os pescadores vindos de longa
viagem a pescar tubarões, barbudos e garoupa entre outros não estando a fim de
curtir a cachaça de alguém.
Mulher:
---
Moço, tenha tento. Vá curtir sua cana em baixo daquele pé de aroeira. – fez ver
a mulher gorda com a bacia entre as pernas.
Porém
o rapaz não se conteve com o conselho da mulher e se voltou para dizer ter
visto um fantasma em plena manhã quando estava seguindo caminho para o local do
Canto do Mangue. E não estava a mentir por coisa alguma. A mulher voltou a declarar:
Mulher:
---
Vá dormir, vá! Seu mal é sono! – lembrou a mulher com um peixe frito por entre
as mãos.
E
os momentos se passavam com o rapaz desnorteado a procura de alguém a lhe poder
ouvir com calma então correu para o pé de aroeira onde procurou repousar. Nesse
momento, outro homem sujo de fétida lama do mangue se acercou de Canindé. Esse
estava acocorado com a cabeça abaixada e presa entre as mãos como se tivesse em
pleno choro torcendo a cabeça para um lado e outro. Então, o pescador se
aproximou de Canindé e lhe formulou questão:
Pescador:
---
Bom dia, moço! Se me der licença, eu fico aqui. – e com isso procurou se sentar
próximo ao rapaz.
Passaram-se
alguns breves minutos e Canindé olhou para um lado vendo a figura do pescador a
remexer o chão com um caniço. O jovem indagou se já ouvira alguém falar em
fantasma ao meio dia, pois ele estava em transe por causa disso. O pescador lhe
respondeu já conhecer a visão do rapaz, uma vez ter visto esses tais espectros
em plenas horas do dia.
Canindé:
---
Jura? – indagou perplexo.
Pescador:
---
Isso é comum. Tão comum como a água do rio. – e apontou para o rio ao largo.
Foi
então que o rapaz Canindé reportou ao pescador estar caminhando em direção ao
Canto do Mangue para chegar até o Iate, onde pousavam os aviões Catalina vindos
quase sempre de outros países. Ele estava apenas a rever os aviões, quando
tentou cruzar a ponte de pau em um local um pouco estreito em uma rua sem nome,
logo adiante.
Canindé:
---
Foi então que me apareceu esse espectro. Eu estava atravessando a ponte e ele
se fez presente. Eu julgava ser gente daqui. Ele falou comigo. Então, sem meias
palavras, a alma sumiu. – respondeu em prantos.
Pescador:
---
Eu te digo: não se aflija. É comum para alguém enxergar ou ouvir os clamores de
alguém que já está em outro plano da vida. Dizer que espíritos apenas aparecem
à noite não é bem assim. Eles estão em toda parte a qualquer hora ou instante.
Aqui no rio, nas casas onde habitam os nobres. E também entre os pobres. Certos
espíritos podem se apegar às coisas terrenas. Há espíritos que são atraídos por
certas pessoas. E há os que preferem lugares. Tais espíritos nem sempre são
inferiores. Um Espírito pode ser pouco adiantado sem que por isso seja mau. –
explicou o pescador.
Canindé:
---
Ah. Eu entendo perfeitamente. Nos últimos tempos eu tenho frequentado sessões
espíritas e tenho “visto” muitos espíritos. Alguns são maus. Outros, nem
sempre. Mas o que me deixa preocupado é o espírito está aqui a qualquer hora! –
reclamou bem rancoroso.
Pescador:
---
O amigo não precisa guardar rancor por nossos espíritos. Eles, enquanto estão
na esfera de fora da matéria humana, merecem nossas estimas e compreensão. São
muitos os espíritos a visitar nossas casas. Hoje, temos cerca de 22 bilhões de
espíritos apenas aqui em nosso planeta, a Terra, fora dos demais que buscaram
outras civilizações. Alguns desses espíritos procuraram planetas de maior
adiantamento. Outros, nem tanto. São inúmeros os Satélites a existir no
Universo. Em tais Satélites estão outros planetas solitários, alguns dos quais
desabitados por consequência de suas temperaturas elevadas. Outros são frios
por demais. Nesses planetas não há condição de vida humana. Veja se entende! –
indagou.
O
jovem Canindé ficou abismado com aquele maltrapilho homem a poder conhecer toda
aquela estória de Satélites e Planetas com tanta perfeição como a nenhum outro.
E ele ficou a cismar por que falar em ciência com tamanha precisão como um
pescador tacanho. Afinal, para Canindé, o assunto Espiritismo era algo por
demais complexo onde pouca gente então podia interpretar com precisão e
argúcia. E querendo saber mais, Canindé observou uma bodega próxima onde ébrios
estava a beber e então ele teve a ideia de indagar ao pescador a olhar para os
embriagados.
Canindé:
---
Aquela é uma bodega! E se eu ou outra pessoa morrer perto, o que acontece? –
O
Pescador nem tanto distraído e com a severidade da indagação se voltou para a
bodega e fez questão em dizer para nortear a inquirição.
Pescador:
---
O uso de álcool produz um atrativo irresistível para os espíritos de um ébrio.
A pessoa que morre em estado de embriaguez passa a acompanhar os seus “amigos”
quando em vida e no momento em que esses fazem o uso do álcool são estimulados
a beber mais continuamente e em maiores doses. Os espíritos comungam do mesmo
padrão de sentimento. É que nessas horas o intercâmbio de ideias e sensações se
torna automático. Os ébrios se tornam verdadeira marionete nas mãos dos
espíritos. – explicou.
Canindé:
---
Tento entender. Mas me diga: o senhor, todo esmolambado como está, onde aprende
tanto assim? - indagou
O
Pescador sorriu devagar e olhou bem para o rosto do rapaz e respondeu:
Pescador:
---
Vedes a casca. Não conheces o sumo. – enfatizou.
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