quinta-feira, 18 de outubro de 2018

SEGREDOS DE RACILVA - - 24 - -



O MAL
Na manhã daquele dia Racilva estava em sua casa, lendo um opúsculo sobre magia, o livro de São Cipriano o Bruxo quando surgiu à porta que dava para fora residência a sua amiga de sempre, Kátia Sobreira. A moça vinha de uma parte da cidade, com certeza a Ribeira ou outro bairro qualquer com uns pacotes debaixo do braço. Reclamando do calor que fazia, Kátia foi ao ponto da conversa, sem mais porquê. E logo mais que conversa a moça mostrou um livro já desgastado que comprou em um sebo instalado no Beco da Lama. Era o Tiçuru um rio após o Baldo da Cidade do Natal. Era a principal fonte de abastecimento de água para os moradores da hoje da chamada Cidade Alta. Kátia sorria de felicidade foi quando desviou o olhar e viu o opúsculo de São Cipriano. Então, indagou.
Kátia
--- Que livro é esse? - - indagou admirada.
Racilva
--- Um livro de São Cipriano. - - dizendo isso, sorriu.
Kátia
--- Ah. Já sei. O macumbeiro. - - e pegou a brochura.
Racilva
--- Pode ser chamado assim. Mas nem sempre o é. Eu até tenho um caso para te contar. E não tem nada com o São Cipriano. Mas tem a ver com casos de macumba. –
Kátia
--- Conte. Eu quero saber. Sou toda ouvidos. - - falou a moça
Racilva
--- Pois bem. Como se diz: quem deseja o mal e faz mal aos outros, recebe três vezes de volta, esse relato é uma comprovação do assunto. O relato que vou te contar é real e ocorreu em uma família daqui da nossa cidade há alguns anos passados. Um cidadão daqui era advogado bem conhecido em nossa cidade. Em anos passados esse advogado de nome Meroveu foi contratado pelo um senhor português seu Manoel dono de uma padaria para realizar o seu desquite. No tempo não existia divórcio no Brasil. O motivo da separação é que estava ciente da sua esposa, Lourdes, estava fazendo vários trabalhos de baixo espiritismo e frequentemente o traía com alguns de seus assistentes de magia negra. –
Kátia
--- Que horror! Que mulher baixa! - - disse a moça exaltada.
Racilva
--- Então. O dono da padaria não gostava de patrocinar ações de família. Mas como o Doutor Meroveu era cliente antigo o advogado aceitou a causa e iniciou o processo. Para se ter uma ideia de como a esposa tinha má índole, a própria filha do casal, com 16 anos, em plena audiência, diante do Juiz defendeu o pai e disse em alto e bom som que a mãe não valia nada e que ela – Lourdes – não prestava. Uma vez que as causas de desquites eram fortes e com a denúncia de traição a dissolução da união foi homologada pelo Juiz. Dias após o término da ação, uma vizinha da frente da casa do doutor Meroveu informou ao advogado que um rapaz tinha parado em frente ao portão e havia jogado um pequeno embrulho no telhado. No mesmo dia o doutor Meroveu pediu para um rapaz do escritório seguisse até lá e pagasse o objeto Naquele embrulho havia duas velas, uma preta e outra vermelha, amarradas com um tipo de cipó preto. O doutor Meroveu, percebendo que era um tipo de “trabalho” foi a um conhecido senhor de umbanda da cidade e informado que realmente era um trabalho de Macumba.
Kátia
--- Nossa! Fizeram serviço para o advogado? E por que? - - espantada.
Racilva
--- Espere! Assim, seguindo a orientação do diretor do Centro, jogou o pobre embrulho no rio. Muito tempo depois ele, o advogado, descobriu que a vela vermelha era para acessar mente e nervos, e a preta, destruição. Contudo, naqueles meses o ambiente em casa ficou tumultuado. A esposa de Meroveu demonstrou graves alterações de humor, criava muito caso com seu esposo, gritava e reclamava do casamento, queria se separar e que estava nervosa e cansada. Coisas que nunca fez ou que tinha falado antes. Dias depois, com o comportamento da esposa, Dr. Meroveu retornou ao Centro Espírita, em uma sessão e identificou que havia outro trabalho colocado em casa. Só que, enterrado.
Kátia
--- Virgem Maria! - -a moça se benzeu em cruzes.
Racilva
--- Disseram que esse “trabalho” era muito mais forte e visava plantar desavença e dificuldades em realizações profissionais e pessoais. Como o jardin de sua casa era grande, o advogado resolveu chamar um jardineiro e retirar toda a grama e a terra da frente. Logo no inicio o jardineiro encontrou um embrulho com osso e terra dentro do pacote. E foi um “trabalho” que os médiuns falaram no Centro. O homem jogou o “trabalho no rio e o Centro fez sessões para proteção do advogado e de sua família. Com isso, a sua esposa acalmou e a vida seguiu normalmente.
Kátia
--- Ainda bem. - - disse a moça
Racilva
--- Mas, numa tarde de sábado, um rapaz de 20 anos ou mais, bem magro, vestindo roupas velhas pediu que gostaria de falar com o dono da casa. Nesse mesmo momento o advogado, que estava ouvindo o jogo pelo rádio, foi até a porta e pediu que ele entrasse. O rapaz falou que não ia entrar na casa porque era indigno e que estava para pedir desculpas. E o advogado ficou surpreso perguntando o que o rapaz, afinal, queria. O rapaz disse que foi amante de uma mulher, casada com um padeiro, cujo nome ele não iria mais pronunciar. Disse ainda que há anos, a mando dessa mulher, foi na casa dele para pegar um “trabalho” e jogar em cima do telhado na casa do advogado e que depois escondeu terra de cemitério no jardim. Então, naquela hora estava arrependido. Contou que a convivência e a vida com a mulher foram uma desgraça. Passou fome, não conseguia trabalho, era malvisto pelos parentes dele e conhecidos que se afastaram dele. A sua vida travou em tempos mórbidos. Mesmo se separando da tal mulher passou anos com as dificuldades financeiras e emocionais. Fugiu da cidade, viajando sem rumo em direção a Minas Gerais. Ficou anos, parando para encontrar emprego em toda cidade por onde passava. Mas, continuava sozinho. Sem família e nunca conseguia nada. Afirmou que tinha vergonha e que escondia a todo custo o seu envolvimento com magia negra. Sem ter o que comer, foi o rapaz a um Centro Espírita numa cidade do Triangulo Mineiro quando um médium que nunca o viu antes lhe disse:
Médium
--- Você fez mal a uma pessoa inocente e lhe desejou coisas ruins. O “trabalho” foi desfeito, mas a sua vida está travada até que obtenha perdão dessa pessoa.”
Racilva
--- Ao falar isso, descreveu como era a pessoa, a cidade, o local da casa, o “trabalho” que tinha feito, em detalhes. O advogado Meroveu ficou atônito com a história e lhe disse que ele, o rapaz, estava perdoado e que tudo era passado. O rapaz agradeceu e que nunca mais voltaria para àquela cidade e nem o incomodaria mais. A dívida cobrada durou anos e foi muito mais cara.
Kátia
---Nossa! O mal sempre morre. É pena sentir o que o rapaz fez. - - soluçou a moça.
Racilva
--- A vida. A nossa vida é cheia de percalço. Nós não sabemos o que fazemos, mesmo depois de desencarnados. Vendo o passado, eu mesma sinto um aperto em meu coração. Não sei de quem, não sei de onde, não sei porque. Eu lembro constantemente de Caio. Sem motivo aparente. Às vezes, eu estou só ou mesmo caminhando nas ruas da cidade e vejo uma figura bem parecida com Caio, o meu marido. Ele vai para onde não sei, dobra uma esquina e some. Tenho vontade de agarrá-lo, mas não tenho poder. Se eu disser a qualquer um, essa pessoa me diz.
Pessoa
--- Isso é normal! Esqueça de Caio! –
Racilva
--- Esquecer, não posso. Não se pode esquecer um amor de tantos anos. Ninguém pode esquecer o marido, o pai, a mãe, os avós. Na se pode esquecer. Não é o não posso. É não deve esquecer um tio, um amigo íntimo ou não. Orar? Faz bem. Mesmo assim eu não posso esquecer a minha avó, minha bisavó que nem a conheci. São apenas lembranças.
Kátia
--- Verdade. Noite dessas eu pensei ou sonhei com meu avô que nem o conheci de muitos anos. Eu era pequena. Vi o ancião apenas no caixão. Me puseram para eu beijá-lo. E eu o baixei. Mas nunca eu o vi no trabalho. Ele trabalhava na Alfândega. E agora eu penso no que o meu avô trabalhava, o que fazia. Nada me vem a memória.
Racilva
--- Você já teve namorado? - -
A moça pensou quem fôra seu namorado.

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