- CHUVA NA SELVA -
-09 -
SUAVE VENENO
Ainda sem meios de entrar em
contato com a redação, Marlene Santos jogava o celular em um canto do banco
tremendo de raiva. A chuva renitente não parava. No meio do mato, o fotógrafo
Armando Souto verificou uma mocinha a dar adeus para o carro onde ele viajava,
e nesse instante preparou a máquina fotográfica para fazer algo de acerto. Ele
pulou para o banco traseiro, onde estava amuada a repórter Marlene Santos e fez
mira para a moça e começou a faina fotográfica. Nesse instante, Marlene Santos
se aborreceu com o fotógrafo pelo fato de como o rapaz se apoiada na banca com
os pés abertos em forma de “A”. Sem mágoas, Armando Souto nada respondia. O seu
intento era fazer fotos o mais breve possível. A moça no alpendre da casa
sorria franco com a sua boca vermelha como um suave veneno. E o seu jeito
brejeiro decantava enfim a estonteante boniteza da selvagem natureza. Esse gênio
sublime agia de mansinho colando no seu olhar a virgem e meiga briosa de visão
altiva. Enfim, ele viu a flor do mocambo feita de palha surgindo em uma
feiticeira vez de um bem brasileiro de gente morena, isoneira até como sua
ingênua tradição. E nisso tudo ele focou a sua câmera. Uma, duas e mais de três
fotos Armando Souto conseguiu filtrar da boneca de cetim em forma de mulher. A
cada passo que Aramando dava era um xingamento a mais feito pela jornalista em
seu banco traseiro. A chuva intensamente caia e o carro seguia seu percurso
apagando-se pela sombra do caminhar distante.
Catolé:
--- Parece que chegamos. – falou
o motorista.
Marlene:
--- Parnamirim? – perguntou com
surpresa.
Catolé:
--- Parece. A chuva é braba. Não
consigo enxergar. – relatou
Marlene:
--- Está escuro! – afirmou a
supor.
Catolé:
--- É a chuva. O transbordamento
da água vem solto pela ribanceira. – alegou.
Em seu lugar, já sentado, Armando
Souto rebobinava a sua câmera e ainda olhava para trás onde a mocinha esteve
por alguns instantes e tão depressa sumiu. As árvores gigantescas não mais permitia
gravar o local da tapera onde a menina moça tinha estado.
Armando:
--- Sumiu! – disse o rapaz.
Marlene:
--- Quem sumiu? – indagou com
raiva.
Armando:
--- A mocinha. – disse o rapaz a
fazer o trabalho em sua máquina.
Marlene:
--- Ah. Besta! Estou p’ra ver! –
disse a jornalista com bastante asco.
Catolé:
--- Quem? – indagou o motorista.
Armando:
--- Uma deusa! – respondeu.
Catolé:
--- Deusa? – esboçou um sorriso
Marlene:
--- Uma megera. – falou
repugnante.
Armando:
--- Veja tua língua! – advertiu
com modos.
Quando rompeu a estrada, Catolé
se assombrou com o volume de carros, caminhões, cegonhas, trucados entre os outros
veículos pequenos e médios. Era um monte de carros parado por não ter saída
para qualquer canto. Aviões continuavam fazendo voos por toda a área enquanto
helicópteros sobrevoavam para outros locais em busca dos restos do Boeing
destroçado em pleno ar. Os aparelhos da FAB engrossavam a fileira com os demais
voos de outros Estados em busca da nave e do meteoro que rompeu o Céu àquela
hora da tarde, não fazia nem duas horas. O ronco dos motores dos aparelhos era
um desassossego para o povo. Na terra, havia mortos atropelados pelos carros.
Veículo tombados como se fossem folhas fugidias de jornais. A chuva importuna
seguia com mais impetuosidade a levar as águas de estrada abaixo por onde o
motorista nem bem podia transitar.
Catolé:
--- Chove quando não se precisa!
– resmungou
Marlene:
--- Espera por mim um pouquinho!
– e abriu a porta descendo do carro. Em seguida, sumiu.
Armando:
--- P’ra onde você vai, sinhá
burra? – indagou o fotógrafo
Catolé:
--- Deixa. Ela foi cumprir suas necessidades.
– falou baixinho.
Armando:
--- Assim, eu também vou! –
relatou
Catolé:
--- E eu vou conversar com os
caminhoneiros, dessa vez. – e desceu do seu veículo estacionado para aquém da
rodovia.
O Hospital central de Parnamirim
estava locado de enfermos, uns à beira da morte. Outros, gemendo e chorado em
um véu de lágrimas na impaciência do destino. Enfermeiras e auxiliares buscavam
a todo custo socorrer os mais aflitos e desterrados da vida. Alguns médicos,
bem poucos mesmo acudiam os doentes sem nada poder fazer. Os aviões passavam
raspando por cima do Hospital. E outros objetos caiam com o soar do barulho.
Carros de bombeiros seguiam a toda presa para um destino incomum, apenas com a
sua zoada infernal provocando maior alarde. Ambulâncias e veículos de pronto-socorro
não paravam de rugir em direção a Natal, a capital do Estado. Era a hecatombe
geral. Mortos pelo meio da rua e carros de polícia a vigiar os lutuosos.
Soldado:
--- É o fim do mundo! – declarava
um policial
Outro:
--- E a gente, o que faz? –
indagou aperreado
Soldado.
--- Nada. Aguardar as ordens. –
relatava a cuspir de lado
No outro ponto da estada o
motorista Catolé, de posse das informações recebidas, adiantou o seu veículo a
percorrer o caminho em direção ao Município de São José. Com a chegada do
fotografo e da jornalista, o motorista seguiu por novo caminho.
Catolé:
--- Falou com a redação? –
indagou à jornalista
Marlene:
--- Sim. Eles não disseram nada.
Apenas mandaram a “gente se virar”. Bosta! – reclamou
Armando:
--- Vou tirar mais fotos dessa
tragédia. – alertou
Catolé:
--- Em vou seguir por São José. É
o caminho mais longo. – relatou
Marlene:
--- Coitada da criancinha. A mãe
morreu e ela ficou a chorar. – relatou a olhar a cena
Catolé:
--- Morte é o que não falta por
essa região. – reclamou prudente
Armando:
--- Até vaca! – e fotografou
reses mortas
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