- OUTRA VIDA -
- 01 -
NO CINEMA -
O dia era um domingo de manhã, 9
horas. Salésia chegou ao Cinema de Arte a começar meia hora depois. Muitos
jovens estavam do lado de dentro do cinema cada qual fazendo o que mais
interessava: ver as figuras dos filmes programados para a próxima semana ou
meses. Colegas da Faculdade se cumprimentavam com cordialidade. De toda a
classe eram os jovens magros, gordos, baixos, altos, morenos e louros. O cinema
era o único da cidade a ter ar condicionado. Salésia sentiu o frio ao adentrar
do recinto, naquele instante, agradável. A música leve soava entoada por
cantores americanos, os de maiores sucessos ou por orquestras como a de Percy
Faith. Manhã de sol e bem cedo para amar lá fora, na rua. Um jovem rapar de
cabelos louros sentado em uma poltrona, esticou seus pés para a cadeira da
frente. Salésia olhou para o rapaz e nada falou. Isso porque ela vestia roupa
feminina. Por momento, ela se fez de vestido a bater dos joelhos algo para
melhor proteger as suas lindas pernas bem torneadas. Moça bela de boa estatura,
Salésia torcia para que começasse o espetáculo. A cortina se abriu como um todo
e o filme teria início naquele ponto. A sala estava repleta com gente nova e
mais antiga. Um casal, acochado, surrava palavras de amor. Ao lado de Salésia,
uma cadeira vazia. E, então veio a ser ocupada por outra virgem moça. Seu nome:
Olga.
Olga
--- Cheguei com atraso? - -
pergunto sorrindo
Salésia
--- Não. Está começando. – -
respondeu a virgem a sorrir também.
Olga
--- Muita gente! Cristo! - - e se
virou para um lado e outro
Salésia
--- O filme é atraente. A Voz do Silêncio. Tcheco. - - relatou
Olga
--- Não passa um filme de tal
natureza nos cinemas locais. - - reclamou
O cinema se expande. Com o apagar
das luzes, quem vai entrando tropeça em outro. Tem um mais afoito querendo
fazer menção sexual vulgar com uma virgem entre os presentes. Com a tela
espalhando a luz para os mais da frente, cega a os que estão mais atrais.
Alguns pedem licença para sentar em uma poltrona mais adiante. Era esse o delirante
ambiente da cena muda. No fim de tudo, o pessoal procurou a saída mais próximas
para ir embora. Olga declarou, sem motivo aparente.
Olga
--- Belo Filme. - - relatou em
muito entusiasmo
Salésia
--- Podia ser melhor! - - sorriu sem maior explicação
O pessoal tomava o seu caminho,
carros passavam, os esquisitos bebericavam em um bar próximo e as duas mulheres
caminhavam até outro canto onde era oferecida bebida quente por demais. Depois
desse encontro, Olga se despediu de Salésia prometendo um reencontro na
segunda-feira à noite quando as duas teriam aulas. Salésia cursava Filosofia.
Ao retorno a moça ouviu de sua mãe que uma sua colega lhe esteve a procura às
10 horas da manhã
Salésia
--- Qual delas? - - quis saber
Dona Laura
--- Eu esqueço do nome. Mas
parece que ela mora da rua de cima. - - respondeu
Salésia
--- Julia? - - indagou
Laura
--- É essa mesma. Diabo de
cabeça! - - bateu com a mão na sua testa.
Salésia
--- Eu sei quem é. Vou almoçar,
agora. Tem fígado? - - indagou animada
O certo é que Salésia tomou banho
por causa do calor insuportável do meio-dia, almoçou e logo após repousou até
superar o cansaço da lida, uma vez que estava meio tonta por causa do vinho que
tomara com sua amiga Olga após assistir ao filme no cinema de arte. Por volta
das duas horas, Salésia estava bem melhor e já podia seguir viagem a casa de
Julia. Seu pai já havia chegado da sede da Estação Ferroviária e beliscou a filha
como gostava de fazer. A mosca se esquivou um pouco, mas não foi possível
evitar o beliscão. Ela sorriu para não dizer que doeu um tanto. O senhor Moises
era maquinista de trem que fazia viagem para Ceará-Mirim em busca de gente e algumas
mercadorias. Salésia observou o relógio da parede para ter certeza ser bastante
tarde, E logo saiu falado alto.
Salésia
--- Já estou indo! Abenção? - -
falou da porta
Laura
--- Já vai? Cuidado! - - alertou.
Com poucos minutos Salésia bateu
à porta da casa de Julia. Quase nem foi preciso porque a moça estava ouvindo música
na radiola com suas pernas esticadas bem próximo à porta de entrada. E observou
para ter certeza vendo de que era Salésia. Por precaução, a moça fez um gesto
com a boca indicando silencio. Em um segundo, Julia saiu de casa e chamou Salésia
para ir mais distante, cruzando a rua de modo a ficar distante da sua casa.
Então já bem distante, ela começou a conversa.
Julia
---Salésia, é o seguinte. Minha mãe é espiritualista. Puxa a meu avô, já falecido.
Eu sei que muitos dos meus parentes são kardecista. Eu não sou. Mas costumava
ir com minha mãe ao Centro. Isso, quando era menor. Bem. Agora veio o problema.
Minha mãe incorpora, sente, vê, tem dom da cura, prevê o que vai ocorrer. É
multe-médium por assim dizer. Quando ela era moça, isso estava bem aguçado. Com
o tempo, o negócio parou. Porém, de um tempo para cá, minha mãe começou a ser
visitada pelo seu pai. O velho já morreu. Deu um quitiripapo e ele caiu morto.
Acontece é que agora o velho reaparece. Ela sorri, conversa com ele e vai que
vai. Eu não sei mais o que fazer. Por isso, eu estou pedindo a sua ajuda.
Pronto! - - resumiu
Salésia
--- Você conheceu o seu avô? - -
perguntou
Julia
--- Eu, não. Ele morreu antes de
eu vir ao mundo! - - declarou
Salésia
--- Como é que você sabe que ela
conversa com o homem que diz ser o seu avô? - - quis saber
Julia
--- Ela me diz. “Eu estava
conversando com meu pai”. Só isso. - - declarou
Salésia
--- Você não pode vê-lo? - -
indagou
Julia
--- Não. Mas faz duas semanas. Ou
quase duas. –
Salésia
--- Antes, ela conversava com
outros espíritos de pessoas da família? - - quis saber
Julia
--- Ela, quando vai a sessão,
sempre conversa com gente desencarnada. Mas, agora, eu com o seu pai. - -
tremendo
Salésia
--- E se eu fosse falar com ela?
- - indagou.
Julia
--- Para conversar com algum
espírito? - - indagou
Salésia
--- Certo. Com meu bisavô, por
exemplo. - -
Julia
--- Sim. Eu acho que pode. - -
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