- DESFILE -
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ENROLADOS
Era assim que Claudio dizia: “Eu
estou enrolado com ela”! E depois sorria. Mecânico por profissão, pela manhã,
logo cedo, Claudio deixava a sua casa, em um beco da rua do Sossego, no bairro
das Rocas, em Natal, RN, e seguia apressado, pelo modo do seu andar, para a
oficina de seu João das Rocas onde já estava com um serviço adiantado a
consertar um motor de Volks antigo. Na oficina, ele estava a chegar as sete
horas da manhã para trocar conversa foram e, ao mesmo tempo cuidar do seu
trabalho. Vez por outra surgia um rapaz com o seu Chevrolet para ser “ajeitado”
e Claudio deixava o Volks para dar “um jeito” do carro, normalmente, velho.
Isso levava horas. Às vezes era um trabalho fora de sua arte. Consertar uma
caixa de marcha, coisa que não tinha mais feito. Mesmo assim, Claudio dava o
seu “jeito” e o dono saía contente e satisfeito para pagar o serviço “mais
tarde”.
Claudio:
--- Beleza! – respondia o
mecânico limpando as mãos cheias de graxa.
E, assim, voltava ao ser trabalho
anterior: consertar a parte de força do motor do Volks. Ao meio dia, parava
tudo. Era hora do almoço. Às vezes fazia a refeição em sua humilde casa. Quando
não, no Bar do Giba, uma tapera feita de madeira onde não havia gabinete
sanitário. Água encanada: Giba já conseguira por às escondidas. Isso é: tinha,
mas não tinha. O Saneamento jamais descobriu essa mutreta. Aliás, quem fez o
serviço da encanação foi um mestre de obras do próprio Saneamento, costumeiro a
beber naquele bar. Por isso mesmo, Severo, - o mestre – não pagava as bebidas
que tomava. E era um dos poucos a ir para dentro do bar onde bebia e
gargalhava. Os demais ficavam sempre no balcão, do lado de fora. No sábado,
toda a galera podia beber dentro do bar, até quando quisesse. Nesse ponto,
tinham advogados, comerciantes, historiadores, poetas entre funcionários das
repartições misturados com a “raça” de mecânicos, para bem falar Era uma
algazarra total em meio a conversas e mentiras.
Certa vez, estava no bar, em um
sábado, a dama Isabel, bela e incandescente. Essa mulher de zona era o par para
qualquer um. Entre as várias mulheres frequentadoras do mereto, algumas também
extasiantes, estava também a Isabel. Cada qual dos frequentadores gostava de
“passar a mão” nas nádegas da bela mulher. Algumas vezes, ela dava o troco: um
copo de cerveja na cara do “atrevido”:
Isabel:
--- Venha, pra levar outra! – e
apontava o copo ainda com um pouco de bebida.
E a gargalhada “comia no centro”.
E Isabel, a andar vagarosa, sorria com o prosaico beberrão. E lá de dentro do
bar, ainda mostrava a garrafa:
Isabel:
--- Quer? – perguntava sem sorrir
Mecânico:
--- Traga e sente aqui no meu
colo! – respondia o trabalhador
Isso era todos os sábados. Quando
era a Semana Santa, na sexta-feira maior, feriado nacional, o bar não
funcionava e nem as damas frequentavam o salão. Aliás, isso era o mesmo em toda
a Avenida 15 de Novembro, maior centro dos bacanais dos cana-bravas. Lojas e
repartições trancavam as suas portas. As oficinas não funcionavam e nem que a
“vaca tossisse”. Era um paradeiro geral. Quando um bêbado da quinta feira
surgia na calçada do Teatro, onde Isabel estava a conversar com outras
mundanas, e perguntava:
Bêbado:
--- Vamos sair? – perguntava
embriagado.
Isabel:
--- Tome aqui, ó! Hoje é dia
santo! Fecha tudo! – e batia em cima do sexo.
O bêbado torcia o nariz para um
lado e para outro, cambaleava e saiu cuspindo brasa.
Bêbado;
--- Puta! – relatava sem senso.
Uma tijolada certeira batia no
ébrio a cambalear em direção ao solo. E as damas da noite caíram na gargalhada
a falar:
Damas:
--- Ah tijolada! – sorriam para
não querer mais.
O bêbado, após alguns minutos, se
levantava e limpava as suas mãos na própria calça, cuspia a areia tragada e, em
seguida, após se soerguer, caminhava para um centro qualquer.
E Isabel respondia com vingança!
Isabel:
--- Puta, é a puta que te pariu,
seu veado!!! – gritava a dama cheia de ódio.
Na quinta-feira de outra semana,
Claudio não apareceu na oficina.
Mecânico - 1
--- Onde está Claudio? –
perguntou alguém preocupado
Estofador:
--- Ainda não chegou. – disse a
rapaz a morder a linha de tecer.
Mecânico – 1
--- Nove horas? – falou o outro
preocupado
Estofador:
--- Com certeza foi a carraspana.
– falou sem brio querendo dizer ter o rapaz bebido além das contas.
Um garoto surgiu na porta de
entrada – e de saída também – e procurou seu João das Rocas para comunicar ter
Claudio saído com a sua mulher para a Maternidade.
João
--- Quando? – perguntou.
Garoto:
--- Agorinha mesmo! Ela foi ter
menino. – e desapareceu feito fantasma
E a turma das demais oficinas se
alegrou querendo beber a saúde da mulher por conta do parto. E foi apenas à 01
hora da tarde que o homem se acercou da oficina. Ele vinha chorando que nem um
cabrito. Seu João ficou, de imediato, preocupado:
João:
--- Que houve? – indagou
preocupado
Entre choros e lágrimas o moço
declarou.
Claudio:
--- Dalvanira faleceu. Não
aguentou a espera! – e chorava que nem um bezerro
João:
--- Morreu? Assim, de repente?
Como é que pode? – reclamava seu João
E a turma das oficinas correu
para ver e ouvir. Claudio não podia mais falar de tanto responder.
Isabel foi a que mais teve
contato com Claudio. E respondeu a ele não se apressar.
Isabel:
--- É isso! Eu tive uma filha só
para morrer. É o destino! – falou sombria.
Na sexta-feira as oficinas não
funcionaram. Todos operários daquela parte da Ribeira foram para o sepultamento
de Dalvanira, mulher jovem de Claudio. Foi uma verdadeira procissão com os
carros a conduzir homens e mulheres entre as meretrizes a lamentar a crucial
perda daquela divina mulher, dona de casa Isabel ficou com Claudio até a altura
da cova onde a morta foi sepultada sem maiores sacrifícios e orações.
Dama:
--- Ela era Crente? – perguntou
uma meretriz.
Isabel:
--- Não! Mas que pergunta? –
respondeu aborrecida.
Dama:
--- Mas podia ser! – reclamou a
meretriz.
Rapaz:
--- O pastor é irmão da vítima! –
concluiu sem medo.
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