- GUERRILHEIRO -
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DURO REVÉS -
Entre uma questão e outra, Isis
continuou o seu debate com o diplomata Ênio Monroe entrando em conflito quando
o assunto descambava contra os guerrilheiros, como sendo a ação governista dos
duros reveses da Revolução e dos perigos enfrentados pelos Generais e seus
seguidores de direita porque esse modo quer apenas se consolidar. É como um
jogo de futebol. A mesma coisa. Começa com a fase punitiva inicial com riscos e
perigos porque em sua ação se comete muitos erros. Na Comissão Geral de
Investigação foram cometidos erros brutais com a cassação e demissão de pessoas
do próprio Governo como catedráticos e professores.
Isis
--- Eu acho que Juscelino
Kubistchek jamais deveria ser cassado. - - falou com cismas,
Monroe
--- Partidos se tornaram
clandestinos. Era o início de duas décadas de Ditadura e, também, da formação
de grupos para combate-la. Logo viria a repressão a esses movimentos de
esquerda e a repressão a seus integrantes. A escolha do Araguaia foi um marco
heroico pois é uma região pouco habitada do Brasil. Em Marabá, no Pará, tem,
hoje, 250 mil habitantes e é banhada pelo rio Tocantins. Cerca de trinta
quilômetros acima ele recebe as águas do rio Araguaia. A zona rural é coberta
por toda a floresta amazônica como era no ponto da guerrilha. - - alertou.
Isis
--- Algumas pessoas, naquela
época, já viviam nas matas, do extrativismo vegetal, como eu tive um parente.
Ele, no ano de 1937, viveu nessa região, colhendo borracha. - - alegou
Monroe
== E tinha gente, em 1970 ou
antes, em 1950. Vivendo na região inóspita, cuidado de gado e tirando mesmo a
borracha. Era uma selva. Agora, a tática dos guerrilheiros era fazer amizade
com essas pessoas, gente rude, por sinal, para depois convencê-la a lutar contra
o Governo e até mesmo pegar em armas, se fosse necessário. - -
Isis
--- A população dessa região
padeceu muito por tal questão. Então, o movimento guerrilheiro, era quem
chamava o povo a participar.
Monroe
--- Esse livro que a senhorita
estava a ler, tem muitos casos de tal natureza. Não sei como o autor conseguiu
detalhar, O se esteve mesmo no lugar e disse por apenas ouvir falar. Mas, o que
eu percebo é que entre os forasteiros, chamados de “paulistas” havia várias
especialidades profissionais: Medicina, Enfermagem, Engenharia, e enfim, viviam
de tocar calados a sua vida, trabalhando, sem ninguém saber o que, de fato,
eles queriam. - -
Isis
--- A prestação de serviços à
gente simples do Araguaia, logo facilitou a amizade. - -
Monroe
--- A narrativa conta que um dos
guerrilheiros mantinha uma farmácia em um casebre de palha de buriti e taipa
tocando a sua vida sem esse negócio de perseguição sendo benquisto por todos.
Isso quem contou foi um homem morador desde o ano de 1952. Seu Saturnino Alves.
E ainda contou que o “paulista” era capaz de atender as pessoas enfermas,
crianças carentes de vacinas ou mesmo mulher estando a ter um filho. Tratava a
todos e não cobrava nada. Seu nome, nunca se soube. Era apenas o “paulista”. -
-
Isis
--- Tinham também mulheres.
Alice, era uma combatente e enfermeira. Criméia Alice, era seu nome. Ela
extraia dentes, fazia curativos, apuntava dedos. Coisas absurdas. - - sorriu
Monroe também sorriu. E falou.
Monroe
--- Era a vida do mato. Alguns
daqueles integrantes do movimento havia recebido treinamento de guerrilha.
Osvaldão, cujo nome era Osvaldo Orlando da Costa tinha treinamento na China e
foi um dos primeiros a chegar no Araguaia, em 1967. O mesmo aconteceu com
Michéas Gomes de Almeida que ficou conhecido por Zezinho do Araguaia. Certa
vez, Michéas declarou que ele e outros guerrilheiros foram para a China em
1965. Ele tirou o seu passaporte com o nome legítimo pegando o avião em
Viracopos indo a Paris e, depois, a China. - -
Isis
--- Eram tempos de treinamento
duro. - - falou calma
Monroe
--- Isso. Isso. Treinamentos
duros, hierarquia militar. Lugares muito
inóspitos. Mas, Zezinho disse que não se queixava. Quando seguiu os
treinamentos na China todo mundo clamava da dureza. Para ele, esse treinamento
era algo de muito natural. A não ser, o manuseio de arma que, para ele, era
desconhecida. Outros tiveram de aprender no lugar onde seria já no campo de
batalha, em plena Amazônia. O treinamento era muito duro. Primeiro, porque a
fase de atração era dura, física e psicologicamente. E as munições eram todas
escondidas na mata. - -
Isis
--- E a perseguição aos
guerrilheiros? - - indagou
Monroe
--- A vida se tornou muito
diferente para quem esteve no Araguaia. Afinal de contas, era gente na cidade.
Profissionais, estudantes. Esse pessoal aprendeu a viver na mata. E isso nem
foi o pior. Logo, o Exército descobriu que o movimento crescia e se organizava
no interior do país. E a caçada começou.
- - relatou e sorriu.
Isis
--- Como? - - indagou assustada.
Monroe
--- A vida seguia para os
“paulistas”, os forasteiros que se infiltrava pelas matas do Araguaia.
Isolados, eles recebiam notícia no resto do mundo, pelo rádio. Cada casa tinha
um rádio. Um Transglobe que era impecável onde os guerrilheiros ouviam a Radio
Tirana, da Albânia, Radio Pequim, Voz da América e BBC. Os guerrilheiros
acompanhavam o que acontecia no mundo. As lideranças do Grupo a que eles
pertenciam – o PC do B – acreditavam que, no máximo eles estariam prontos para
dar início à tomada do poder. O que havia era pouca presença do Estado por
aquelas bandas. - -
Isis
--- Ninguém conhecia a região? -
-
Monroe
--- Uma área que o Governo
conhecia como o ex-ministro Militar, governador do Pará. Coronel Jarbas
Passarinho, falava sempre com o Comando, era uma região inóspita e os que
entravam ali, só penetravam para cobrar impostos e nada mais. O povo estava
abandonado. Eram os tempos da construção da Transamazônica. Nesse tempo, havia
as lendas. O povo contava que a estrada era o novo tempo que estava se abrindo.
E os moradores nunca tinham visto aquelas máquinas que arrebentavam a floresta,
a cavar tanta terra. Aquilo parecia uma maldição dos tempos. E havia uma lenda
de quem não atravessasse o Araguaia naquele momento, não atravessaria jamais,
porque o Araguaia seria convertido em um “grande fogo”. - -
Isis
--- Era uma previsão do Padre
Cícero, do Juazeiro. - - gargalhou
Monroe
--- Então. – (também sorriu) –
Mas, em 1971, cerca de 70 pessoas vindas de várias partes do país se dividiam
em três grupos com um comando central. Havia mais alguns simpatizantes vindos
da própria região. O trio que comandava era composto por João Amazonas,
Maurício Garbois e Ângelo Arroyo. O paraense, militante comunista era militante
desde 1935. No Araguaia representava o Comando Supremo e encarava as questões
que o seu partido defendia o da soberania do Brasil.
Isis
--- Ele era velho. - -
Monroe
--- Sim. Já estava com 72 anos.
Ele nasceu em 1912, em Belém, do Pará. Foi tido como uma epopéia pela liberdade
na guerrilha do Araguaia. O líder morreu em 2002. Mauricio Garbois era baiano.
Foi para o Rio de Janeiro na Escola Militar e, logo, se aproximou dos
Comunistas. No comando da guerrilha era considerado um estrategista. Jamais
voltaria do Araguaia. Morreu exilado pelas Tropas que o caçavam pelas matas.
Ângelo Arroyo era o Chefe Militar do Grupo. Líder do Sindicato do Metalúrgicos
de São Paulo nos anos 50. Foi um dos poucos a escapar naquelas selvas. Ajudado
por Zezinho do Araguaia, conseguiu chegar a São Paulo. - -
Isis
--- E escapou mesmo? - - perguntou
querendo saber.
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