sábado, 8 de novembro de 2014

À LUZ DA LUA - 06 -


- Jodie Foster - 

- 06 -

SUÇUARANA

Suçuarana ou Sussuarana como se chama pelos caminhos do sertão é uma onça parda e de um modo solitário a preferir locais de difícil acesso tais como florestas, desertos e montanhas. Geralmente caça ao entardecer. O carneiro, o veado e o caititu constituem suas presas habituais. Os adultos se comunicam por meio de uma espécie de silvo estridente. A fêmea tem a cria em cavernas ou em cepos ocos. O seu período de vida é de 12 anos. A gestação gira em 90 dias e os filhotes nascem pintados com manchas escuras no corpo. O seu pelo é em geral de cor bege rosado, podendo ser cinza, marrom ou cor de ferrugem. A suçuarana está a vontade em cima das árvores. Conta-se que uma só suçuarana matou 15 carneiros durante uma saída para caçar. Por outro lado, ela raramente ataca o homem e tem tanto medo de cães que sobe em árvores para escapar deles quando acuada.
Certa tarde/noite um homem do campo sentiu falta de alguns carneiros em seu quintal. Ele era seu Joca Tributino, homem rude e de pouca conversa. Tributino vivia em arrumado de fazenda comprado de herdeiros no sertão do nordeste brasileiro. Na casa morava a mulher, uma vez que os filhos se largaram logo cedo para cuidar da própria vida em terras do Goiás. Nesse dia da falta de seus carneiros o homem rude mascou fumo para poder pensar. A sua criação envolvia cabras, bodes, ovelhas, gado e uma danação de carneiros, sendo esses para mais de cinquenta de tarara. Sem saber a procedência do sumiço dos carneiros ele, então, resolveu atinar para algum bicho estranho, talvez uma serpente devoradora de animais grandes ou mais ou menos. De sorte acendeu o seu cachimbo para melhor tecer os seus argumentos.
Joca:
--- Danação! Só pode ter sido cobra! – pensou o velho Jacó a descontento da sorte.
A lua estava clara bem no alto da chapada para onde Joca olhou sem acerto. Os três cachorros – sendo uma cadela – estavam no desassossego a brincar entre eles até chegar a hora da xepa -  arroz, farelo de milho, carne bovina e muita gordura. A mulher da casa, dona Clinaura, era a responsável para dar a comida aos cães de média raça. O homem, seu Joca Tributino continuava a pensar nos carneiros então perdidos na mata grande onde o homem plantava e colhia de tudo um pouco, de frutas a plantio de casa. Árvores imensas faziam o seu acerto. Joca cuidava dos menores pés de pau enquanto os maiores ficavam por conta da natureza. Com um pouco de tempo surge dona Clinaura com a xepa dos cães.
Clinaura:
--- Chega pra lá molestado. Vem comer aqui! – lembrava a mulher enquanto os arruaceiros cães balançavam a cauda cheios de alegria.
O homem nem dava conta dos cães. A sua preocupação era com os carneiros desaparecidos visto ser um monte de criação para a venda do fim da semana na feira livre da cidade onde homens de comércio colocaram preço por saber da criação de Joca. E dos demais desaparecidos estavam os maiores e de bom preço para a venda. Nas feiras livres do interior a comercialização de ovinos e caprinos já chega em transporte de caminhões muitas vezes lotados até demais. Seu Joca tinha o cuidado de arrumar seus ovinos nas carrocerias da camioneta de modo a não sacrificar os animais. Esse era um dos casos de oferecer um melhor preço na compra e venda dos bichos. No entanto o desaparecer de alguns carneiros levou ao tormento o velho Joca o qual não sabia a razão.
Joca:
--- Clinaura. Tu avistasses alguma cobra pros esses lados? – indagou preocupado
Clinaura:
--- Eu não. Ora mais! – disse a mulher sem graça alguma a alimentar os cães.
Joca:
--- Só perguntei! – resolver de volta.
Por mais longo tempo o homem ficou de pé ou sentado em uma cadeira a procura de resolver os seus sentidos. Era noite de lua nova e o seu clarão não fazia festa. A minguante deixaria o matuto atordoado.
Joca:
--- Se fosse minguante dava para notar. Uma escuridão de monta. – fez ver.
Clinaura:
--- Quantas cabeças? – perguntou sem se virar.
Joca:
--- Talvez oito a bem querer. – relatou um pouco cismado.
Clinaura:
--- É bem capaz de ser onça. – disse a mulher se levantando e com as mãos nas ancas.
Joca:
--- Onça? E tem onça para esses lados? – indagou de sobressalto
Clinaura:
--- Eu vi as pegadas de uma há poucos dias para os lados da lagoa. – completou.
Joca:
--- Como? E por que não de dissestes? – falou alarmado
Clinaura:
--- Eu não crio bode! Tem mais! – declarou a mulher ao entrar na casa.
Joca:
--- Não é bode! É carneiro! Sua besta! – resolveu com malcriação.
Clinaura:
--- Bode, carneiro, vaca. Tudo é uma coisa só! E não vem com malcriação! Ouviu? – disse mais a contenda.
Naquela noite o homem não dormiu pastoreando o rebanho. Era uma vez o cachimbo e de outra o fumo de mascar. Ele entrava e saia de dentro de casa com bastante cuidado para ver se notara alguma marca de suçuarana, por sinal.  Os cães estavam alertas a qualquer motivo. E o homem dizia aos caninos.
Joca:
--- Vê se nota alguma suçuarana por perto, ouviu? – indagou aos cães.
O mais esbelto balançou a cauda[aa1] .  Os outros se esticaram no chão a observar o extenso terreno a procura de alguma onça por acaso aparecesse. O velho homem saiu da sua casa com a espingarda já no alvo de passar fogo. E por alí, na saída do terraço encostou a arma a aguardou o bicho com bastante atenção. Joca cuspiu fumo e acendeu o cachimbo na espreita da maldita a qual se enfurnara nas brenhas da mata.
Clinaura:
--- Vai dormir? – indagou se espreguiçado.
Joca:
--- Não! – respondeu o homem meio desaforado
Corria a noite e às vezes a lua desparecia encoberta por uma nuvem não permitindo se olhar o céu então escuro. De um determinado instante, o cão grunhiu espantado. O velho olhou à gente e viu apenas o matagal. O cão se levantou e caminhou devagar a seguir pelos demais cães e, alertados, seguiram a trilha onde havia a presença de alguma coisa. O homem, alarmado, seguiu também os seus três cães tendo logo engatilhado a arma e teve o tino de apontar para algum ponto. Na perseguição aguerrida, os três cães, a latir intermitente se enturmaram num frondoso pé de maçaranduba onde estava a onça com bastante temor. O velho Joca chegou logo atrás com a sua arma pronta para o disparo e não ouvia mais nada que os latidos dos enormes cães em alvoroço, perseguindo o tronco de maçaranduba e a querer subir onde a suçuarana estava bem no alto, trepada com sua cara enfurrascada para os seus inimigos. De imediato o velho Joca se acercou da mata e tentou alvejar a parte bruta do animal. A falta de iluminação da lua dificultava o homem por completo. De qualquer modo, ele mirou em uma espécie de barriga a estar vendo e fez fogo:
Joca:
--- Se é essa, tome tiro! – alertou o homem sem a menor segurança
O gato soltou um tremendo silvo e caiu da cima da árvore para morrer. Os cães se vingaram por completo estraçalhando a suçuarana já em estado mortal. Eram latidos e granidos dos três animais ante o terror do velho Joca garantindo ter morto a assassina malsinada:
Joca:
--- Tais morto bicho brabo! – declarou sossegado
Foi um tiro certeiro aquele de Joca Tributino em uma noite já quase nublada onde os demais animais apenas ouviram o latir dos cães de caça. A vida pacata do sertão voltou a reinar àquela noite sombria. No bagageiro da camioneta Ford na manhã daquele sábado ainda morno Joca Tributino desembarcou o lote de animais.




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