- Camila Belle -
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ADONIAS
Era manhã bem cedo. Adonias
cultivava o seu terreno como fazia todos os dias. Plantava ele as suas
hortaliças entre outros eventos simples até demais. Enquanto plantava, ele
cantava melodias antigas dos velhos tempos. Canções quem ouvisse de nada
entenderia. O homem já era um tanto idoso como as suas velhas canções. E assim,
Adonias trabalhava sem dar conta do presente ou do passado levando a castigada
vida apenas a cantarolar e cultivar a terra. O vento soprava ainda sem levantar
quentura e pessoas a transitar pela estrada íngreme de barro não observavam
aquele suave cantarolar do paciente e modesto ser. A sua mulher estava na casa
alpendrada e, por sua vez, fazia o manjar do almoço a servir por volta do meio
dia. Clara por igual cantarolava como se estivesse a acompanhar o marido em sua
faina diária. Uma gaiola pendurada na entrada da casa: era um sabiá a gorjear
uma saudosa melodia. No terreno do bem amplo quintal, um cata-vento a trabalhar
sem reclamar puxando água da parte baixa do local. Cachorro a repousar na
entrada do alpendre como se estivesse esperando a comida. Um galo a entoar a
sua voz melodiosa para ter a certeza de ser ouvido. Um sujo chiqueiro com
porcos a ronronar como a estar conversando entre eles. O sol a brilhar ainda
fraco. Era o dia a iniciar a sua gestação preguiçosa.
Sem notar o que se passava ao
derredor, Adonias mandou calar o cão por latir a qualquer preço. Ele, Adonias,
não viu o homem naquele melancólico instante. Apenas o cão notava a sua
inquieta presença. E assim ocorreu o sucedido. Ao voltar a terra, Adonias
avistou perto de si, um outro compadre, conhecido de longas eras. E quase
tremeu de susto. Nestor não era tão idoso como parecia ser. O seu aspecto era
de um homem sadio, moço e forte. Na certa, foi um assombro para o idoso
Adonias. A questão era de que seu velho compadre tinha sido morto a tempo e
tanto, pelo ditar das pessoas de fora quando bastante comentavam. E aquele
espanto colheu Adonias de surpresa:
Adonias:
--- Você não era o compadre
Nestor? – indagou com pleno susto
O homem, ainda com a sua pouca
idade, sorriu. Após alguns segundos, o jovem homem então falou com segurança.
Nestor:
--- Sou eu mesmo. Eu vim convidar
para conhecer a minha nova casa? – falou com alegria
Adonias:
--- Casa? Que casa? E a outra? –
perguntou surpreso o velho amigo.
Nestor:
--- Aquela casa não é minha,
hoje. Os herdeiros tomaram posse. Eu tenho outra. – sorriu.
Adonias:
--- Outra? Mas como? Você vendeu
a casa velha? – indagou sem entender de certo.
Nestor:
--- Eu não vendi. Mas já me deram
outra muito mais elegante. – falou sorrindo
Adonias:
--- Eu não entendo como! E a
velha (casa)? – falou inquieto.
Nestor:
--- Vamos conhecer a nova (casa).
– sorriu o aparente homem
Adonias:
--- Mas como? Estou trabalhando
agora! – lembrou sem temor.
Nestor
--- Encoste a ferramenta e me dê
a mão. – disse o compadre.
Sem saber o que estava a ser
feito, o idoso homem largou as suas tralhas e segurou na mão de seu compadre
duvidado do que ouvira falar. Em um instante, Adonias sumiu. Como uma
alucinação verdadeira, o homem idoso, em um instante estava em outro local.
Mesmo pulando de um plano para outro, Adonias reconheceu o novo local da mesma
forma como se estivesse em um só recanto da velha cidade. E Nestor aludiu:
Nestor:
--- Veja aonde eu resido, hoje.
Uma moradia singular onde habitam várias pessoas, uns até mesmo conhecidos e
outros, nem tanto para você. – relatou
Adonias ficou assustado com
aquele ambiente. E chegou a ver antigos compadres a quem os cumprimentou
acertadamente. A residência era toda mobiliada e ao setor mais para além
estavam mulheres e crianças a trocarem conversas por ele não escutadas. Aquela
era uma maravilha de residência. Tudo de moderno estava presente. De sofá a
escrivaninha. Molduras de pessoas, candelabros, uma mesa com modernas cadeiras.
Um luxo só. Após breves instantes Adonias indagou:
Adonias:
--- Onde estão os outros? –
perguntou meio assustado.
Nestor:
--- Alguns estão a caminhar pela
rua. Outros saíram para determinados locais. – sorriu
O idoso amigo refez mais uma
questão.
Adonias:
--- Espere! Mas você morreu! –
perguntou assustado.
O jovem compadre sorriu e
respondeu:
Nestor:
--- Compadre, não se morre. Você
está agora em uma nova dimensão. Em mais um Universo. São milhões de Universos
a se percorrer. Eu estou nesse, agora, como estive em outros, no passado e ainda
vou estar no futuro. Para você acreditar, nós não vivemos nem no passado nem no
presente. Tudo é Universo. É um multiverso. – sorriu com satisfação
O velho homem coçou a sua cabeça
para falar:
Adonias:
--- Não entendo nada do que o
compadre fala. Isso é coisa de eu estar sonhando. – reafirmou
Nestor:
--- Quer se encontrar com outros
velhos conhecidos? – indagou sorrindo.
Adonias:
--- Eu vejo as pessoas que estão
aqui? – indagou surpreso
Nestor:
--- Eu tenho certeza. Mulheres,
homens e meninos. Os meninos talvez você nem se lembre tanto. Mas as moças,
essas você se lembra de verdade. – falou com severa afirmação.
E os dois amigos perambularam
pela rua, naquela hora, à noite onde pouca gente estava a caminhar. Era uma rua
por Adonias bem conhecida. Contudo, a não ser por suas lembranças, tinha algo
de diferente. Todas as casas estavam todas fechadas. Todas ou quase todas. E peregrinado
por caminhos incertos, o idoso homem topou com uma moça toda vestida de cor
branca e, de imediato, ele a reconheceu:
Adonias:
--- Leonor, é você? – perguntou
surpreso
Leonor:
--- Como vai, querido. Faz um bom
tempo. – falou alegre e cheia de graça
Adonias:
--- Por Nossa Senhora! Mas você
morreu? – indagou quase a chorar.
Leonor:
--- Quem disse isso? Eu estou
bem. E você? – dialogou.
O velho homem voltou a coçar a
cabeça por se lembrar de tantos anos passados quando ele conviveu com Leonor em
tempos remotos. Por isso mesmo, Adonias chorou da imensa saudade de ter estado
com a moça naquele incontável instante. Ele nem mais precisava descrever com os
perdidos afetos e delicados carinhos nos entraves da emoção de belos e
imagináveis tempos. Era a saudade do eterno anseio. Teatro, cinema, pracinhas,
velhos carnavais, cerveja em um bar da esquina, viagem de trem, banhos de mar,
a sombra de coqueiros, beijos ao luar entre eternas juventudes.
Leonor:
--- Saudade do bem-querer, amor!
– lembrou em verdadeiro êxtase.
O velho senhor das estrelas nada
mais conseguiu falar.
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