- Katherine Heigt
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PERERÊ
Pererê era o seu nome. Todos o
chamavam assim. Ele era um menino dos seus oito ou dez anos. Nem ele sabia ao
certo. Não tinha pai. Com certeza, o seu pai foi morto com uma facada no ventre
quando fazia chamego com uma mulher ainda bem nova, por trás de uma porteira,
durante uma noite de escuro. O homem que o matou, fugiu para sempre e nunca
mais foi visto pelas bandas daquele inóspito sertão bravio. A mulher, se
desgarrou como sempre as mulheres costumavam fazer. O seu filho único, o
Pererê, ficou largado no meio de meninos, mulheres e cangaceiros, sujeitos
rudes e mal-encarados como só eles existiam. E Pererê morava na fazenda do
coronel Diomedes, homem alto, robusto e de pouca conversa. Todos os capangas da
fazenda temiam o Coronel, menos o menino Pererê. Quando o homem precisava de
algo para ser buscado em outra fazenda do próprio coronel, ele chamava depressa
o criado Pererê, menino astuto e de pouco dengo o qual saía na carreira com os
pés batendo nos quadris para ir e voltar dentro de um só instante. E Pererê
fazia tudo certo do jeito como o coronel mandava. Quando nada tinha a fazer,
ele jogava bilocas – que eram bolas de gude – com os colegas do sítio, sempre a
levar a melhor. Desarnar, era coisa difícil para o garoto. Não passava da
tabuada e do ABC. Contudo para contar lorota, ele tomava de conta. Fantasma da
meia-noite era o que ele mais era sabido.
Pererê:
--- Olha! Vou te contar!!! Eu,
ontem vi um mal assombro de meter dedo nos olhos! O homem vinha sozinho com uma
foice na mão e um bisaco a tiracolo só em minha direção!!! Eu fiquei apavorado
com o assombro. Quando o velho se aproximou de mim, sumiu!!! – disse ele com os
boticos de olhos bem arregalados.
Os meninos que o escutavam,
tremiam de medo. Assombração era coisa ruim. De meter medo até mesmo no coronel
Diomedes.
Garoto 1
--- E você contou ao coronel? –
perguntou com o rosto tenso.
Pererê:
--- Eu não! Tá doido? O coronel
me engole vivo!! – respondeu o menino com tensa emoção
Garoto 2
--- E não tinha outro capanga por
perto? – perguntou outro menino deveras assombrado.
Pererê:
--- Não. Sé estava eu lá nos
montes das quebradas!! – replicou o garoto
Garoto 3
--- E o que você estava fazendo
em um lugar tão distante? – fez a pergunta um terceiro
Pererê:
--- Eu voltava do sítio das
Gameleiras, tarde da noite, quando me deparei com o assombro!! – respondeu em
tensa agonia.
Garoto 1
--- Tu tinhas fuzil? – ainda perguntou
o primeiro garoto de tanto assombrado.
Pererê:
--- Tá doido!? Fuzil é para
homem!!! Eu levava apenas no meu bisaco o meu estilingue! – tremeu de medo
Garoto 2
--- Ele queria alguma coisa? –
perguntou o outro de olhos aboticados.
Pererê:
--- Sei lá! Noite escura que nem
breu! Ele caminha apenas em minha direção quando, de repente desapareceu.
Evaporou! – falou de pleno medo.
Nesse momento, uma mulher da
cozinha chamou o garoto Pererê para ir receber um recado do coronel a está
sentado em sua cadeira de balanço com uma das pernas passada por cima do braço
do assento.
Mulher:
--- Pererê!!! O coronel tá a tua
procura!!! – gritou a mulher com impertinência.
O moleque saiu na disparada. E
chegando ao coronel, se pôs de pé com as mãos para trás.
Pererê:
--- Pronto Coronel! Estava
conversando com os outros garotos. – respondeu com voz mansa.
Coronel:
--- Ah. Bom. Vá a fazenda das
Gameleiras e traga dos sacos de mel de engenho! E leve dois homens com você.
Eles vão trazer os sacos. Vá num pé e volte no outro! É pra já! – falou com voz
austera.
E o garoto não se fez de rogado.
Buscou dois homens tarugos e foi embora na carreira em busca dos sacos de mel.
Na metade do caminho, ele se lembrou de indagar. E voltou a toda pressa:
Pererê;
--- Coronel! E se não tiver mel
de engenho, posso trazer de Uruçu? – indagou de cara alegre.
Coronel
--- Você ainda está aqui? Não!
Pois bem! Traga! É melhor! – desconversou o coronel
Pererê:
--- Dois? – fez com os dedos
estirados para cima.
Coronel:
--- Sim! Mas vá embora moleque!!!
– falou bastante bravo
Na Fazenda das Gameleiras, o
menino buscou o caseiro e indagou se tinha dois sacos de mel para levar para o
Coronel Diomedes. O caseiro apontou para o monte de saco cheio de mel. E o
garoto indagou.
Pererê:
--- Uruçu? – indagou sem saber
qual eram os sacos.
Caseiro:
--- Qualquer um! – respondeu o
caseiro a fumar o seu cachimbo.
Pererê:
--- Qualquer um, não! Eu preciso
de saber qual o que pego! – respondeu meio bruto.
Caseiro:
--- Ora moleque! É você quem vai
beber? Qualquer um! E pronto! – respondeu com a maior brutalidade
Pererê:
--- Olha, seu velho surdo! Se eu
levar um desses e não for de Uruçu o senhor vai para o tronco! – respondeu o
garoto dizendo ao velho o local do lugar da morte.
O caseiro quase morre de medo. O
tronco era o terrível local do sacrifício para quem desobedecia as ordens do
coronel Diomedes E logo se levantou do velho tamborete e buscou entre os sacos
um dos tais de Uruçu. Quando encontrou o saco, foi logo dizendo:
Caseiro:
--- Taí! Só tem um! – falou um tanto
aborrecido
Pererê:
--- E o outro? – perguntou o
moleque um tanto indignado
Caseiro:
--- O outro só quando Deus me der
fortuna! – respondeu o homem completamente irado
Pererê:
--- E esse? – apontou para um
outro saco contendo o mel de Uruçu.
Caseiro:
--- Ô criança impertinente. Pois
tem ainda esse. Leve e mande o corno beber até morrer! – e voltou a se sentar
em seu tamborete.
Pererê:
--- Pois eu vou dizer ao coronel
que o senhor disse que ele era corno! – discutiu abusado.
Caseiro:
--- Quem disse isso, seu moleque?
– discordou de pleno medo de ir para o tronco.
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